01/08/2013

Uma manhã qualquer...


“O trabalho humaniza as pessoas.”

Frase piadista do meu livro de Filosofia
06h25.
Sofia encarou o relógio com muito pesar, mas a realidade estava à sua porta: deveria levantar para ir ao trabalho.
Lavantou-se com o ânimo de um zumbi andando, e foi lavar-se.
07h00.
O ônibus já estava chegando ao ponto e ela olhou para a mensagem de texto que havia recebido de um amigo. Ótimo, o dia seria apenas mais um como todos os outros.
Passou pela mesma paisagem, a qual via todos os dias naquele mesmo horário, encontrou as mesmas pessoas de sempre, que debatiam sobre os mesmos assuntos.
“Olha a cor do esmalte que eu to usando.“
“Briguei com o namorado, acho que vou largar dele.”
“Ontem choveu e acabou com a minha chapinha.”
“A passagem tá cara, né?”
Etc, etc, etc.
Mesmos assuntos, mesmas pessoas.
Sofia sabia que ela também reclamaria da chuva que estragou seu cabelo, e que mandaria as mesmas mensagens para as mesmas pessoas de sempre, pois seus assuntos raramente se divergiam.
Tomou o segundo ônibus, e dessa vez foi sentada, olhando o caminho já familiar a seus olhos.
Pensou com lamúria no seu salário que receberia naquele dia e nas formas de gastá-lo.
Acho que vou comprar um lanche na esquina. Outro dia compro um lanche na rodoviária, e tenho que experimentar alguma lanchonete do centro... pagar minhas despesas, comprar, guardar para o futuro...
Era desanimador pensar que após começar a trabalhar, ela só pararia depois que sua vida tivesse passado, então Sofia fazia de tudo para ter o mínimo de diversão garantida em seus dias.
Seu trabalho não era dos mais pesados, ao contrário, era único e não exigia tanto esforço de si.
Olhou-se no espelho e ficou insatisfeita com a imagem reproduzida.
Precisaria de uma hidratação no cabelo também, pois sua situação estava precária.
A faxineira aparecera para limpar sua sala, e ela sentiu a necessidade de puxar conversa. Não que achasse que era a obrigação conversar com outras pessoas, mas Sofia gostava de manter o mínimo de educação com todos.
Fora muito bem educada, por sinal.
A outra mulher apresentava em sua face marcas de que sua vida havia sido dura e sofrida, aparentando no mínimo 40 anos de idade. Mas como nada é o que parece ser, a mulher tinha apenas 26.
Sem sonhos, nem perspectiva de vida, a faxineira mantinha o olhar baixo e era de poucas palavras. O sorriso não parecia convir em seu rosto tristonho.
Sofia sentiu a súbita necessidade de saber mais sobre a mulher, sua história de vida.
Queria conhecer as experiências pelas quais ela passara e a transformara assim...
Ela, que se chamava Tatiane, tinha um filho de nove anos de idade, e um marido desempregado em casa.
Um passado sofrido, e no final do mês, o mesmo salário que Sofia recebia, mas no caso de Tatiane, era usado para manter sua pequena família.
Sofia se sentiu subitamente egoísta por desperdiçar tanto do que ganhava com coisas mesquinhas, enquanto com o mesmo salário, uma mulher guerreira sustentava com muito pesar aqueles que amava.
Mas será que havia cabimento em se sentir assim?
Não era sua culpa se o mundo era injusto com os menos favorecidos, ou que a mulher trabalhasse mais do que Sofia. Ou mais ainda, pelo salário que a outra ganhava.
Não tinha culpa pelos problemas do mundo, ela não o produzira, apenas nascera para ser habituada a ele.
Sua vida era forçosamente capitalista, mas seus sentimentos eram de uma socialista que ainda tinha a grande esperança de que um dia o mundo poderia mudar para melhor, e quem sabe nesse novo mundo, todas as pessoas teriam seu valor exposto não apenas na conta bancária, mas na forma de serem tratadas por outros.
O trabalho a havia humanificado, pois acrescentara experiência de vida para sua bagagem de conhecimento, mas e a pobre mulher, o que ganhara?
Seu trabalho era digno, mas seu salário não pagava nem um décimo do valor que representava como pessoa.
Sofia tinha culpa disso? Não, mas ela viu a necessidade de mudar seus conceitos de vida.
Não poderia ajudar a todos sem antes ajudar a si mesma, mas de uma coisa ela estava certa: independente da raça, cor, religião... ela ainda iria fazer algo que pudesse mudar a vida de alguém, dando-lhe esperança de vida, e um motivo para continuar...
Ela queria muito isso, mas boas intenções não eram capazes de mover uma palha.
Aquela era a hora de mover-se e ajudar a pobre mulher.
Mais do que isso, Sofia estaria ajudando a si mesma, a se tornar humana... 

8 comentários:

  1. Lindo. Achei que no decorrer da história, Sofia iria se cansar da rotina de sempre, pois eu detesto rotina, AUSUASH' -q

    Achei o texto muito nobre, Ju. Realmente, essa pobre mulher merecia muito mais do que ganhava ;3 Guerreiros merecem tudo.

    Beijos,

    Juu-Chan do Nescau com Nutella.

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    1. Olá Ju, também odeio rotina, mas essa reflexão foi o final mais digno que encontrei para algo que venho pensando há dias.

      Beijos.

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  2. Oi Ju td bem? Rotina só é boa se o que fazemos nos dá prazer e nossos hábitos, são a repetição de atos, que nem sempre nos damos conta de que os fazemos, mas que muitos são necessários.E os guerreiros são capazes de romper com a rotina, sendo criativos nas mesmas coisa que fazem.Um abraço e me visite.

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    1. Oii Lia, tudo sim e você?
      Gostei do que escreveu, é possível fazer as mesmas coisas todos os dias, mas de formas diferentes,

      beijos.

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  3. Eu gostei do texto, no começo achei que estava lendo sobre mim, sobre meus momentos sem sentido, sabe? Eu fico muito triste de gastar a vida com um trabalho que não gosto, mas tem hora que penso que sou uma privilegiada de poder largar tudo porque não preciso sustentar uma família e porque eu penso sobre isso, sobre minha vida e das pessoas que me cercam na mesma rotina que eu. Porque pensar em nossos dias já é um diferencial, as pessoas estão tão distraídas cumprindo suas obrigações que não percebem que a vida está passando e não estão sendo felizes, às vezes até uma família se torna um fardo a carregar porque é preciso trabalhar duro para mantê-la, eu penso também todos os dias que as pessoas deveriam ser mais bem remuneradas, vejo que os que mais trabalham são os que menos recebem em troca e não sei o que fazer com tudo que penso sobre essas injustiças.

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    1. Olá Dani! Sei bem como é.
      Infelizmente, aquele trabalhos que exercem menos valor intelectual é desvalorizado.
      Será que um dia todos serão tratados com igualdade? Haha, difícil...

      Beijos.

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  4. Atravesso a cidade.
    Dou aulas.
    Meu trabalho me faz ganhar cerca de 400 reais por mês.
    Mesmo assim, sei que o que faço vale a pena.

    Acho que ser humana é isso: saber que o que se faz, vale a pena...

    Um beijo,

    http://algumasobservacoes.blogspot.com.br/
    http://escritoshumanos.blogspot.com.br/

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    1. Olá Fer!
      É uma pena que os salários sejam tão desiguais, mas se você se sente bem fazendo o que você faz, no final essa é a recompensa maior*-*

      Beijos.

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