“O trabalho humaniza as pessoas.”
Frase piadista do meu livro de Filosofia
06h25.
Sofia encarou o relógio com muito
pesar, mas a realidade estava à sua porta: deveria levantar para ir ao
trabalho.
Lavantou-se com o ânimo de um
zumbi andando, e foi lavar-se.
07h00.
O ônibus já estava chegando ao
ponto e ela olhou para a mensagem de texto que havia recebido de um amigo.
Ótimo, o dia seria apenas mais um como todos os outros.
Passou pela mesma paisagem, a
qual via todos os dias naquele mesmo horário, encontrou as mesmas pessoas de
sempre, que debatiam sobre os mesmos assuntos.
“Olha a cor do esmalte que eu to usando.“
“Briguei com o namorado, acho que vou largar dele.”
“Ontem choveu e acabou com a minha chapinha.”
“A passagem tá cara, né?”
Etc, etc, etc.
Mesmos assuntos, mesmas pessoas.
Sofia sabia que ela também
reclamaria da chuva que estragou seu cabelo, e que mandaria as mesmas mensagens
para as mesmas pessoas de sempre, pois seus assuntos raramente se divergiam.
Tomou o segundo ônibus, e dessa
vez foi sentada, olhando o caminho já familiar a seus olhos.
Pensou com lamúria no seu salário
que receberia naquele dia e nas formas de gastá-lo.
Acho que vou comprar um lanche na esquina. Outro dia compro um lanche
na rodoviária, e tenho que experimentar alguma lanchonete do centro... pagar
minhas despesas, comprar, guardar para o futuro...
Era desanimador pensar que após
começar a trabalhar, ela só pararia depois que sua vida tivesse passado, então
Sofia fazia de tudo para ter o mínimo de diversão garantida em seus dias.
Seu trabalho não era dos mais
pesados, ao contrário, era único e não exigia tanto esforço de si.
Olhou-se no espelho e ficou
insatisfeita com a imagem reproduzida.
Precisaria de uma hidratação no
cabelo também, pois sua situação estava precária.
A faxineira aparecera para limpar
sua sala, e ela sentiu a necessidade de puxar conversa. Não que achasse que era
a obrigação conversar com outras pessoas, mas Sofia gostava de manter o mínimo
de educação com todos.
Fora muito bem educada, por
sinal.
A outra mulher apresentava em sua
face marcas de que sua vida havia sido dura e sofrida, aparentando no mínimo 40
anos de idade. Mas como nada é o que parece ser, a mulher tinha apenas 26.
Sem sonhos, nem perspectiva de
vida, a faxineira mantinha o olhar baixo e era de poucas palavras. O sorriso
não parecia convir em seu rosto tristonho.
Sofia sentiu a súbita necessidade
de saber mais sobre a mulher, sua história de vida.
Queria conhecer as experiências
pelas quais ela passara e a transformara assim...
Ela, que se chamava Tatiane,
tinha um filho de nove anos de idade, e um marido desempregado em casa.
Um passado sofrido, e no final do
mês, o mesmo salário que Sofia recebia, mas no caso de Tatiane, era usado para
manter sua pequena família.
Sofia se sentiu subitamente
egoísta por desperdiçar tanto do que ganhava com coisas mesquinhas, enquanto
com o mesmo salário, uma mulher guerreira sustentava com muito pesar aqueles
que amava.
Mas será que havia cabimento em
se sentir assim?
Não era sua culpa se o mundo era
injusto com os menos favorecidos, ou que a mulher trabalhasse mais do que Sofia. Ou mais ainda,
pelo salário que a outra ganhava.
Não tinha culpa pelos problemas
do mundo, ela não o produzira, apenas nascera para ser habituada a ele.
Sua vida era forçosamente capitalista, mas
seus sentimentos eram de uma socialista que ainda tinha a grande esperança de
que um dia o mundo poderia mudar para melhor, e quem sabe nesse novo mundo,
todas as pessoas teriam seu valor exposto não apenas na conta bancária, mas na
forma de serem tratadas por outros.
O trabalho a havia humanificado,
pois acrescentara experiência de vida para sua bagagem de conhecimento, mas e a
pobre mulher, o que ganhara?
Seu trabalho era digno, mas seu
salário não pagava nem um décimo do valor que representava como pessoa.
Sofia tinha culpa disso? Não, mas
ela viu a necessidade de mudar seus conceitos de vida.
Não poderia ajudar a todos sem
antes ajudar a si mesma, mas de uma coisa ela estava certa: independente da
raça, cor, religião... ela ainda iria fazer algo que pudesse mudar a vida de
alguém, dando-lhe esperança de vida, e um motivo para continuar...
Ela queria muito isso, mas boas intenções não eram capazes de mover uma palha.
Aquela era a hora de mover-se e ajudar a pobre mulher.
Mais do que isso, Sofia estaria ajudando a si mesma, a se tornar humana...
Lindo. Achei que no decorrer da história, Sofia iria se cansar da rotina de sempre, pois eu detesto rotina, AUSUASH' -q
ResponderExcluirAchei o texto muito nobre, Ju. Realmente, essa pobre mulher merecia muito mais do que ganhava ;3 Guerreiros merecem tudo.
Beijos,
Juu-Chan do Nescau com Nutella.
Olá Ju, também odeio rotina, mas essa reflexão foi o final mais digno que encontrei para algo que venho pensando há dias.
ExcluirBeijos.
Oi Ju td bem? Rotina só é boa se o que fazemos nos dá prazer e nossos hábitos, são a repetição de atos, que nem sempre nos damos conta de que os fazemos, mas que muitos são necessários.E os guerreiros são capazes de romper com a rotina, sendo criativos nas mesmas coisa que fazem.Um abraço e me visite.
ResponderExcluirOii Lia, tudo sim e você?
ExcluirGostei do que escreveu, é possível fazer as mesmas coisas todos os dias, mas de formas diferentes,
beijos.
Eu gostei do texto, no começo achei que estava lendo sobre mim, sobre meus momentos sem sentido, sabe? Eu fico muito triste de gastar a vida com um trabalho que não gosto, mas tem hora que penso que sou uma privilegiada de poder largar tudo porque não preciso sustentar uma família e porque eu penso sobre isso, sobre minha vida e das pessoas que me cercam na mesma rotina que eu. Porque pensar em nossos dias já é um diferencial, as pessoas estão tão distraídas cumprindo suas obrigações que não percebem que a vida está passando e não estão sendo felizes, às vezes até uma família se torna um fardo a carregar porque é preciso trabalhar duro para mantê-la, eu penso também todos os dias que as pessoas deveriam ser mais bem remuneradas, vejo que os que mais trabalham são os que menos recebem em troca e não sei o que fazer com tudo que penso sobre essas injustiças.
ResponderExcluirOlá Dani! Sei bem como é.
ExcluirInfelizmente, aquele trabalhos que exercem menos valor intelectual é desvalorizado.
Será que um dia todos serão tratados com igualdade? Haha, difícil...
Beijos.
Atravesso a cidade.
ResponderExcluirDou aulas.
Meu trabalho me faz ganhar cerca de 400 reais por mês.
Mesmo assim, sei que o que faço vale a pena.
Acho que ser humana é isso: saber que o que se faz, vale a pena...
Um beijo,
Fê
http://algumasobservacoes.blogspot.com.br/
http://escritoshumanos.blogspot.com.br/
Olá Fer!
ExcluirÉ uma pena que os salários sejam tão desiguais, mas se você se sente bem fazendo o que você faz, no final essa é a recompensa maior*-*
Beijos.